Computação e Sociedade
A condição humana traz-nos uma série de questões importantes, se por um lado somos seres racionais com uma sensação de invencíveis, por outro somos dotados de uma fragilidade que nos coloca num conjunto de incertezas.
Por conseguinte a tecnologia apresenta-nos uma ambivalência pois se por um lado liberta o homem de determinadas funções, de outro lado vem subjugando a sociedade à lógica quantitativa destas mesmas máquinas.
Podemos imaginar o futuro, quando ocorrerão mudanças drásticas no homem e na natureza, que serão possíveis com a ajuda da tecnociência, e o seu universo de manipulações, desde a manipulação genética à manipulação da atividade simbólica. Vivemos numa era de concubinato entre o homem e elementos cibernéticos, associando e permitindo-lhes viver com vantagens.
A tecnociência leva o homem a confrontar-se com questões que são únicas nos nossos tempos. Esta nova ordem traz ao homem uma expansão da capacidade técnica inimaginável e cujas consequências irão provocar um enorme tremor na própria existência do ser humano. Ou seja, a definição de homem, tal como foi concebida é, hoje em dia, colocada em dúvida. A capacidade moral e ética é atingida, sendo-nos cada vez mais difícil decidir o que é correcto do que está errado. Os nossos valores e juízos éticos são abalados atingindo a nossa capacidade de raciocinar.
“As inovações tecnocientíficas têm trazido em seu seio mudanças profundas no ethos das sociedades nelas envolvidas.” – Newton, Aquiles von Zuben – ou seja, o homem é atingido na sua capacidade de raciocinar, pois os valores éticos, que antes eram a principal base da compreensão, hoje são desadequados e desnecessários. As evoluções na tecnociência têm sido encaradas como actos violentos, inumanos e anti-naturais. Se por um lado qualquer manipulação simbólica é aceite e considerada legítima e moralmente válida, por outro alguma intervenção maior, por exemplo ao nível da genética, é considerado impensável e diabólica.
Com todas estas evoluções já existe um quase ditado popular: “o problema não é especializar, mas o especialista generalizar” ,ou seja, com todas estas mudanças e exigências todos nós temos que ter um pouco de conhecimento em todas as áreas. Assim, tomaremos como exemplo do uso da tecnociência a clonagem, a robótica e a eutanásia. Não deixa de ser interessante questionar esta relação entre ética e tecnociência.
Em primeiro lugar, a ética era tradicionalmente referenciada ao homem, ao seu interior, à busca das qualidades que lhe permitissem honrar a sua essência. Sem exagerar nos conceitos, essa ética era intemporal e tinha os seus postulados ao abrigo de qualquer discussão.
Hoje, porém, colocam-se ao ser humano uma série de novas questões, algumas das quais emergem da consciência do poder da ciência e, mais do que isso, da consciência dos poderes que envolvem, produzem e utilizam a dita ciência e todos os discursos que nela se suportam. A consciência desse poder, agora que a ciência progressivamente se vê derrubada do se pedestal à medida que se vai constatando o fracasso do seu projecto emancipador, leva à emergência do seu questionamento, à discussão dos seus pressupostos metodológicos, da sua filosofia estruturadora, e, para aquilo que nos interessa, das suas consequência e dos reflexos que os seus produtos – tecnológicos e ideológicos – têm na vida dos seres humanos e, acima de tudo, no seu "querer".
Por um lado, e em termos muito simplistas, a tecnociência parece a todo o momento pôr em risco o ambiente natural e a humanidade inteira. Humanidade em risco naquilo que diz respeito à sua vida, as ameaças, qual espada de Damocles, que o crescente declínio dos equilíbrios ambientais produzem; mas também risco da sua própria essência, na medida em que essa mesma ciência vai permitindo e prevendo uma crescente intervenção no seu corpo, na sua genética, colocando em risco, no dizer de alguns — para outros, ainda bem — aquilo que se pode considerar ser a sua essência.
A ética aparece revitalizada por esta nova situação, por este momento crucial, fornecendo a possibilidade de reflexão séria e desapaixonada destes a todos os títulos novos problemas colocados pela produção científica.
O continente gnoseológico da ciência vê-se confrontado por um lado pelo questionamento dos seus alicerces do rigor e objectividade inquestionáveis de que fizer apanágio, e por outro lado, vê-se confrontado pelo questionamento ético que o homem faz dos seus produtos e dos reflexos que eles têm na vida do Homem. Este vê alargado o campo das sua preocupações éticas, promovendo a integração nos “cuidados” que devia à sua vida, à sua felicidade, dos “cuidados” a ter com o ambiente, os animais, todos os seres vivos e com os produtos da tecnociência…
Postado por José Maria da Silva Junior.